3 multas gravíssimas

Três multas gravíssimas em um intervalo de doze meses colocam qualquer condutor à beira de perder a Carteira Nacional de Habilitação, podem aumentar substancialmente o custo do seguro do veículo, provocar impactos profissionais, gerar responsabilidade civil e até desdobramentos criminais em caso de acidente. A regra é simples, mas as implicações são amplas: conhecer como funciona o sistema de pontos do Código de Trânsito Brasileiro, quais infrações gravíssimas suspendem a CNH de forma automática e como se defender administrativamente faz toda a diferença entre continuar dirigindo ou ficar meses impedido de exercer esse direito. Neste artigo, oferecemos um panorama completo sobre o tema, destrinchando a legislação, explicando etapas do processo, demonstrando riscos, apresentando exemplos e sugerindo boas práticas para evitar a reincidência.

Como o CTB contabiliza três infrações gravíssimas

O Código de Trânsito Brasileiro introduziu um sistema de pontuação graduada. Cada infração recebe pontos conforme a gravidade: leve (3), média (4), grave (5) ou gravíssima (7). No novo regime instituído pela Lei 14.071/2020, o limite anual varia de 20, 30 ou 40 pontos, dependendo da quantidade de infrações gravíssimas acumuladas:

  • 40 pontos se o condutor não cometeu nenhuma gravíssima;

  • 30 pontos quando há uma;

  • 20 pontos quando há duas ou mais.

Logo, ao atingir a terceira multa gravíssima dentro de 12 meses, o motorista extrapola o teto de 20 pontos, o que leva à instauração de processo administrativo de suspensão por excesso de pontuação. Nesse cenário, mesmo que não existam infrações de outro tipo, apenas três gravíssimas bastam para suspender a habilitação.

Diferença entre infrações autossuspensivas e pontuação acumulada

Nem todas as gravíssimas seguem o fluxo de acumular pontos. O CTB classifica algumas como autossuspensivas, ou seja, geram imediatamente a abertura de processo de suspensão, independentemente do total de pontos. Exemplos incluem dirigir sob influência de álcool (art. 165), recusar o teste de alcoolemia (art. 165-A), arrancada brusca ou manobra perigosa (art. 175), excesso de velocidade superior a 50 % do limite (art. 218 III) e dirigir na contramão em faixa de ônibus (art. 184 III). Uma única ocorrência dessas infrações já dispara o procedimento de suspensão. Se o infrator comete três infrações autossuspensivas no mesmo período, o DETRAN abrirá três processos distintos, sem prejuízo do processo por acúmulo de pontuação que correrá em paralelo.

Prazos de suspensão previstos em lei

Para suspensão por pontos, o prazo mínimo é de seis meses e o máximo de um ano. Se o condutor reincidir em 12 meses, o mínimo sobe para oito meses e o máximo para dois anos. Já nas infrações autossuspensivas, cada artigo traz prazo específico; por exemplo:

  • Art. 165 e 165-A: 12 meses;

  • Art. 175: 2 a 8 meses (8 a 18 meses na reincidência);

  • Art. 218 III: 2 a 8 meses (8 a 18 meses na reincidência).

Um motorista com três gravíssimas autossuspensivas pode, portanto, acumular suspensões sequenciais — período que, somado, ultrapassa facilmente dois anos longe do volante.

Processo administrativo: etapas e prazos de defesa

  1. Autuação e notificação – o órgão autuador tem 30 dias para apontar a infração ao proprietário.

  2. Defesa prévia – prazo de 30 dias para contestar erros formais (placa ilegível, ausência de foto, prazo decadente).

  3. Imposição de penalidade – se a defesa é rejeitada, emite-se a multa e lançam-se pontos.

  4. Notificação de abertura de processo de suspensão – DETRAN informa a soma de pontos ou a infração autossuspensiva e concede novo prazo de 30 dias para defesa.

  5. Julgamento – se indefere, o motorista ainda pode recorrer à JARI e, depois, ao CETRAN.

  6. Aplicação da penalidade – confirmada a suspensão, o condutor entrega a CNH e cumpre o prazo.

  7. Curso de reciclagem e prova teórica – após o período, frequenta 30 h de aulas, faz exame, paga taxas e reavê o documento.

Efeitos colaterais na vida profissional

Motoristas profissionais — caminhoneiros, taxistas, condutores de aplicativo, motoboys — dependem da CNH para sustento. Três gravíssimas podem significar meses sem renda. Empresas de transporte exigem prontuário limpo e suspendem contratos ou aplicam justa causa se o funcionário perde o direito de dirigir. O histórico pesa na seleção de vagas, e seguradoras de frota aumentam o prêmio quando o funcionário acumula infrações gravíssimas, pois interpretam comportamento de risco.

Impacto no seguro veicular

Companhias seguradoras consultam bancos de dados públicos antes de renovar a apólice. Três gravíssimas podem elevar a franquia ou gerar recusa de cobertura, sobretudo em apólices de valor elevado. Em caso de sinistro durante período de suspensão, o segurado pode ter a indenização negada por agravamento voluntário do risco, já que dirigia sem habilitação válida.

Repercussões civis e criminais em caso de acidente

Se o motorista acumula três gravíssimas por condução agressiva e, em seguida, causa acidente, a jurisprudência confirma a culpa grave ou até dolo eventual. Isso eleva indenizações por dano moral, material e pensão. Se houver lesão grave ou morte, o Ministério Público pode usar o histórico de infrações para pedir reclusão por homicídio culposo qualificado (art. 302). A reincidência demonstra desprezo ao dever de cuidado, agravante que pesa na fixação da pena.

Exemplo prático de sequenciamento de processos

Imagine que um condutor cometa, em fevereiro, excesso de velocidade acima de 50 % (autossuspensiva); em abril, seja flagrado dirigindo embriagado (autossuspensiva); em agosto, receba multa gravíssima por avanço de sinal com risco de acidente (não autossuspensiva). As duas primeiras abrem processos imediatos de suspensão, um de 8 meses, outro de 12. A terceira soma sete pontos e, com os 14 das anteriores, totaliza 28 pontos, exigindo processo por pontuação, com suspensão de oito meses por reincidência. Ao final, o motorista cumprirá suspensões consecutivas, podendo ficar quase três anos sem CNH.

Defesa técnica e estratégia processual

Advogados especializados analisam cada auto: legalidade do equipamento de velocidade, bafômetro aferido pelo Inmetro, presença de testemunhas. Outro ponto é o atendimento ao prazo de notificação. Se o órgão demorou mais de 30 dias, há nulidade. No processo de suspensão, examina-se se o DETRAN agrupou corretamente as infrações do mesmo período ou se conteve falhas na pontuação. A estratégia comum é atacar as autossuspensivas, pois anular uma infração elimina sete pontos e, em muitos casos, impede que o limite de 20 seja alcançado.

Educação e reabilitação

Além do curso de reciclagem obrigatório, há programas de direção defensiva que focam redução de comportamentos agressivos. DETRANs oferecem palestras gratuitas; seguradoras concedem desconto a quem comprova certificação. A reeducação vai além de decorar regras: envolve percepção de risco, empatia no trânsito e gestão de estresse — fatores que geralmente estão por trás de infrações gravíssimas.

Reflexo para o proprietário que não dirige

Se o dono do veículo não indicar condutor e for autuado três vezes, corre o risco de ter a CNH suspensa ainda que jamais dirija. Empresas de locação ou frotas precisam controlar multas para não verem seus gerentes perdendo habilitação. A legislação isenta pessoa jurídica de pontos, mas exige identificação do motorista; se isso não ocorrer, aplica multa em dobro e dificulta licenciamento anual.

Três gravíssimas e a possibilidade de cassação

Suspensão não é cassação. Contudo, se o motorista for flagrado dirigindo durante suspensão, o artigo 163 prevê cassação da habilitação. Cassado, ficará dois anos sem dirigir e, após o prazo, terá de refazer todo o processo de obtenção: exame psicológico, prova teórica e prática. Assim, três gravíssimas podem desencadear efeito dominó até a perda definitiva do direito de dirigir por longos anos.

Comparativo internacional

Na Espanha, bastam duas infrações muito graves ou três graves em dois anos para perder a permissão de dirigir, com multa alta e cursos de reciclagem custeados pelo infrator. No Reino Unido, a cada duas infrações “endorsement code” DR ou IN, a carteira é suspensa. O Brasil, ao criar limites diferenciados de 20, 30 e 40 pontos, adotou modelo intermediário: tenta educar, mas mantém punição exemplar para reincidência gravíssima.

Boas práticas para evitar a terceira gravíssima

  1. Planejamento de rota – evite pressa, raiz de muitas gravíssimas.

  2. Tecnologia a favor – use limitador de velocidade e aplicativos que alertam radares.

  3. Zero álcool ao dirigir – elimine a maior causa de suspensão imediata.

  4. Manutenção preventiva – falhas mecânicas podem levar a manobra perigosa.

  5. Gestão de estresse – técnicas de respiração ajudam a conter arrancadas bruscas.

  6. Atualização constante – mudanças recentes de legislação pegam motoristas de surpresa.

Perguntas e respostas

O que acontece se um motorista acumular exatamente três infrações gravíssimas em 12 meses?
Ele ultrapassa o limite de 20 pontos e o DETRAN instaura processo de suspensão por pontuação, além de qualquer processo autossuspensivo específico.

Três gravíssimas autossuspensivas aplicam suspensões simultâneas ou consecutivas?
Consecutivas; cada processo possui prazo próprio e só após cumprir um o condutor inicia o seguinte.

A suspensão vale para todas as categorias da CNH?
Sim. Suspensa a categoria B, por exemplo, todo o documento fica inválido, inclusive A.

Posso dirigir veículo de outra pessoa enquanto recorro?
Até a decisão final que imponha a suspensão, você pode dirigir; após confirmada, não.

A multa pode virar advertência?
Não. Gravíssima nunca se converte em advertência por escrito.

Motorista profissional tem limite de pontos maior?
Não. A lei igualou todos os condutores. O que muda é a possibilidade de usar defesa de exercício da profissão em penalidades de pontos, mas não para gravíssimas autossuspensivas.

Tomei duas gravíssimas em janeiro e uma em dezembro. Conta como três no mesmo período?
Sim, se o intervalo entre a primeira e a última for de 12 meses corridos.

Vale usar exame toxicológico negativo como atenuante?
Não. O exame é obrigatório para categorias C, D e E, mas não reduz penalidade.

Posso parcelar multas gravíssimas?
Quase todos os DETRANs aceitam parcelamento em até 12 vezes no cartão, mas o processo de suspensão continua independente do pagamento.

Recupero pontos após o curso de reciclagem?
Os pontos permanecem arquivados. O curso só libera a CNH, não apaga o histórico.

Conclusão

Três multas gravíssimas são o limiar que separa a condução legal da suspensão do direito de dirigir. Seja pelo modelo de pontuação que reduz o teto para 20 pontos, seja pelas infrações autossuspensivas que independem da soma, o motorista reincidente enfrenta prazos longos sem CNH, perda de oportunidades de trabalho, aumento do seguro e risco de cassação se insistir em dirigir. A prevenção — por meio de direção defensiva, planejamento, respeito às regras e atualização jurídica — é a melhor forma de evitar esse cenário. Quando o pior acontece, conhecer o processo, os prazos de defesa e as exigências do curso de reciclagem ajuda a mitigar danos. Afinal, mais do que um documento, a habilitação representa liberdade de locomoção, instrumento de trabalho e responsabilidade compartilhada pela segurança de todos no trânsito.

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