Tomar uma multa durante o primeiro ano de habilitação – período da Permissão para Dirigir (PPD), popularmente chamado de “provisória” – levanta de imediato a dúvida: posso indicar outro condutor para “transferir” a infração e evitar a perda da minha carteira? A resposta curta é que a indicação de real infrator só é legítima se quem dirigia for realmente outra pessoa; quando o condutor era o próprio permissionário, qualquer tentativa de transferência configura fraude, não afasta as consequências administrativas previstas no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e ainda pode gerar processo criminal por falsidade ideológica. Com isso esclarecido, este artigo aprofunda todos os aspectos legais, práticos e estratégicos ligados ao tema, oferecendo um guia completo para quem recebeu autuação na PPD.
O que é a permissão para dirigir
A PPD é um título provisório emitido ao condutor recém-aprovado nos exames de habilitação. Dura doze meses e tem validade em todo o território nacional. Durante esse ano de “observação”, o CTB impõe tolerância zero para infrações graves ou gravíssimas e limita a apenas uma infração média. Se o permissionário ultrapassar esses limites, perde o direito à Carteira Nacional de Habilitação (CNH) definitiva e precisará recomeçar todo o processo de habilitação.
Regras de cancelamento da ppd
O artigo 148, §3º do CTB estabelece o cancelamento da PPD quando o condutor:
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comete infração gravíssima,
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comete infração grave, ou
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comete mais de uma infração média.
Nesses casos, o Detran instaura processo de cassação da permissão, e o interessado deve refazer exames médico-psicológicos, curso teórico e prova prática.
Diferença entre indicação de real infrator e transferência irregular
Indicar o verdadeiro condutor é direito previsto no artigo 257 do CTB. O permissionário preenche o formulário de indicação, reconhece firma das assinaturas, anexa cópia da CNH de quem efetivamente dirigia e envia ao órgão autuador no prazo de quinze dias. Contudo, se o permissionário estava ao volante e tenta “emprestar” pontos, a conduta se enquadra como falsidade ideológica (art. 299 do Código Penal) e pode anular a indicação, mantendo a punição original.
Por que a ppd não tolera infrações graves
A ideia de um ano de “teste” é reduzir acidentes causados por motoristas inexperientes. Estatísticas do Denatran mostram que condutores com menos de doze meses de habilitação têm o dobro de risco de colisões fatais. A severidade normativa busca forçar comportamento seguro e disciplinado logo no início da vida ao volante.
Procedimento de autuação e prazos
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Lavratura do auto de infração.
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Envio da notificação de autuação em até 30 dias.
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Prazo de 15 dias para indicar real infrator ou apresentar defesa prévia.
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Julgamento.
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Notificação de penalidade e lançamento de pontos.
Se o permissionário não indica outro condutor no prazo, presume-se que ele dirigia.
Pontuação e processo de cassação
Após registro da penalidade, o Detran avalia o prontuário:
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sendo grave ou gravíssima, instaura imediatamente o processo de cassação da PPD;
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havendo segunda infração média, também instaura.
Durante esse processo, a PPD continua válida até a decisão final, mas não será convertida em CNH se confirmada a infração.
É possível recorrer e manter a ppd?
Sim. O permissionário ainda pode:
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apresentar recurso à Jari,
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recorrer ao Cetran, e
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ajuizar ação judicial.
Se a penalidade for anulada em qualquer instância antes da emissão da definitiva, não há cancelamento. Contudo, recursos meramente protelatórios não afastam a contagem de prazos internos; decide-se caso a caso.
Multas por excesso de velocidade: peculiaridades
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Até 20 % acima do limite – infração média; duas ocorrências na PPD já levam à cassação.
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Entre 20 % e 50 % – infração grave; cancela de imediato.
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Acima de 50 % – gravíssima com suspensão direta e multa multiplicada por três; cancela a PPD e ainda gera processo autossuspensivo.
Infrações autossuspensivas e efeito imediato
Algumas gravíssimas, como dirigir alcoolizado (art. 165) ou realizar manobra perigosa (art. 175), suspendem o direito de dirigir de qualquer condutor. Para o permissionário, além da suspensão, há cassação da carteira provisória, somando duas penalidades independentes.
Fraudes comuns e suas consequências
Emprestar documento para assumir pontos de permissionário é prática recorrente. Quando descoberta, gera:
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cancelamento retroativo da transferência,
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cassação da PPD,
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abertura de inquérito por falsidade ideológica,
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aplicação de multa pelo art. 238 do CTB (falta de indicação),
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processo contra o “emprestador” por co-autoria.
Jurisprudência relevante
Tribunais estaduais confirmam cassação mesmo quando o processo se prolonga além de um ano, desde que a infração tenha ocorrido dentro da vigência da PPD. O STJ entende que a lei não prevê decadência especial; vale o princípio de que “quem não cumpre as condições do título não adquire o direito à CNH definitiva”.
Exemplos práticos
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Caso A – permissionária recebe multa grave por celular ao volante. Indica o pai como condutor, mas imagens de câmera confirmam que ela dirigia. Detran anula a indicação e cancela a PPD.
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Caso B – permissionário é multado duas vezes por velocidade média (até 20 % acima). Recorre de uma, perde outra. Como restou uma média apenas, recebe a CNH definitiva.
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Caso C – motorista Uber na PPD pega corredor exclusivo de ônibus, infração média. Meses depois passa em avanço de sinal (grave). PPD cassada, mesmo sem decisão final sobre a média anterior, pois a grave é suficiente.
Responsabilidade civil e penal
Se o permissionário causa acidente enquanto conduz sob infração gravíssima (ex.: embriaguez), além da cassação enfrentará ação cível por danos e processo criminal por lesão ou homicídio culposo. No juízo, o fato de estar em período de PPD e ter descumprido regras de tolerância agrava a culpa.
Dúvidas frequentes sobre indicação de condutor
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Posso indicar depois de 15 dias?
Não. Expirado o prazo, só resta defesa de mérito, não a indicação. -
E se o veículo é de empresa?
A PJ deve indicar quem dirigia; se omitir, paga multa em dobro e mantém pontos no responsável legal. -
Fotos inexistem ou estão ilegíveis; isso salva minha PPD?
Se a infração exigir prova fotográfica e ela faltar, cabe anulação. -
Aceitam indicação sem reconhecimento de firma?
A maioria dos órgãos exige firma reconhecida; sem isso, indeferem. -
Se vencer o prazo da PPD enquanto recorro, recebo a CNH?
O Detran só emite a definitiva após análise do prontuário; pendência de processo impede a emissão.
Boas práticas para não perder a permissão
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Evite dirigir em horários de pico se ainda não domina manobras.
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Use aplicativos de velocidade e alerta de radar.
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Adote filosofia “zero risco”: nem celular, nem bebida, nem pressa.
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Estude legislação; pequenas distrações geram infrações médias.
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Guarde todos os avisos de autuação para controlar prazos de defesa.
Perguntas e respostas
Recebi uma multa leve. Perco a PPD?
Não. Multas leves não afetam a permissão.
Duas multas médias no mesmo dia cancelam?
Sim. O art. 148 fala em mais de uma infração média, independentemente da data.
Se perder a PPD, posso tirar carteira de outra categoria?
Não. Precisa recomeçar pela categoria B, cumprir todo o processo.
Pagamento da multa impede cassação?
Não. A quitação encerra o débito financeiro, mas a pontuação permanece.
Posso fazer seguro com PPD cassada?
Seguradoras negam cobertura a condutor sem habilitação válida.
Conclusão
Durante a permissão para dirigir, a margem de tolerância é mínima: qualquer infração grave ou gravíssima, ou a soma de duas médias, cancela o caminho rumo à CNH definitiva. A indicação de outro condutor só é legítima se quem estava ao volante realmente for pessoa distinta; tentar “transferir” pontos sem base fática é fraude que acrescenta problemas administrativos e criminais. Por isso, o melhor antídoto continua sendo a condução prudente. Cumprir o primeiro ano sem deslizes garante não apenas a carteira definitiva, mas o início de uma trajetória segura e responsável no trânsito.